Crónicas de França
de Wes Anderson
André
Bernardo 11º E | Escola Secundária Dona Luisa de Gusmão
Crónicas de França é uma homenagem ao jornalismo impresso.
Evidentemente espelhando o New Yorker,
Crónicas de França do Liberty kansas Evening Sun é o mais recente filme de Wes
Anderson. Escrevi estas linhas ao som da banda sonora
do filme e sugiro que também seja lido dessa maneira.

A narrativa trata da
história de Arthur Howitzer Jr. (Bill Murray)
que convence o seu pai, diretor do jornal Liberty Kansas Evening Sun, a
financiar as suas férias à cidade fictícia francesa de Ennui-sur-Blasé no ano
de 1925 escrevendo um suplemento para a edição de domingo, Crónicas da França.
Estas férias acabaram por ser de uma vida. Howitzer transforma o suplemento de
sucesso numa revista independente. Este só tem duas regras “nada de chorar” (no
crying), frase que tem escrita em cima da porta do seu escritório e “Apenas
tenta fazer parecer que escreveste dessa maneira de propósito” (Just Try To
Make It Sound Like You Wrote It That Way On Purpose). No ano de 1975 chega a
sua morte e, como estipulado no testamento, a revista será desmantelada. O
filme acompanha esta última edição da revista dividida em quatro artigos de quatro excêntricos e particulares colunistas.
Crónicas de França é
possivelmente o filme mais Wes Anderson de Wes Anderson. Esta longa metragem
junta toda a carreira do cineasta, todas as suas técnicas distintivas, numa
obra que grita o seu nome. A paleta pastel, a simetria, o pragmatismo e rapidez
da narrativa, os detalhes e acima de tudo, a composição planimétrica.
Cada segundo deste
filme é planeado. A atenção ao detalhe e a minúcia são o ponto alto do filme.
Contado a cores e a preto e branco, a integração destes dois elementos é
extremamente bem feita com uma sequência inicial que estabelece a razão da sua
existência.
O filme, à semelhança
dos seus predecessores, faz uso de um humor cartoonizado trazido por um toque
ou uma visão infantil da ação. Este é criado através de cortes repentinos e uma
câmara que se mantém sempre perpendicular ao plano de fundo movendo-se quase
como do ponto de vista de um observador lá colocado que nos está permite
experienciar a ação pelos seus olhos. Faço a comparação a, na literatura, uma
narrativa contada na terceira pessoa.
Destaco a cena
inicial ou, para a revista, o primeiro artigo, “Cycling Reporter”. Sazerac
(Owen Wilson) apresenta-nos Ennui e a sua dualidade entre o presente e o
passado, os telhados impregnados de gatos e o chão repleto de ratos, a média de
8.25 corpos que são encontrados nos rios e canais. As características da cidade
podem por vezes trazer um olhar negro mas, como antes referi, um observador
infantil apresenta-nos sempre estes pontos num cariz cómico transmitido através
do contraste entre a narração e o que observamos.
A longa metragem está
também carregada de referências a outros filmes, como “O homem que sabia
demais" de Alfred Hitchcock que, claramente, faz um paralelo com a última
história do filme e o que será o último artigo da revista. Outras comparações
podem ser feitas entre o revolucionário francês Jean-Paul Marat e a cena em que
a personagem de Timothée Chalamet escreve o seu manifesto na banheira de toalha
na cabeça.
Por uns momentos
esquecemos o desastre que foi a cimeira Cop-26, as vagas de migrantes que
desesperadamente tentam atravessar a fronteira de Bielorrússia com a Polónia
ou, a um nível mais pessoal, que a troca de metro da linha verde para a linha
vermelha na Alameda está desfasada. Um mundo mais simples, onde a ordem é
diferente, passageira e subjetiva. Saio do filme a agir e a falar à velocidade
da narrativa que acabei de disfrutar. Anderson consegue trazer-nos para dentro
desta sua história, para dentro de um pitoresco aconchegante.